quarta-feira, novembro 23, 2011

Leões Nas Ruas

Leões...
Leões nas ruas. Leões nas ruas e vagando, feras no coração da cidade. Leões em ruas quaisquer de cidade quaisquer de ruas várias. Sangue nas ruas. Os homens não conseguem ver os leões. Não é do seu feitio, e os leões apreciavam demais observar os homens para ameaçar o caráter oculto de sua presença. Não reconhecem, mas são cegos. Não enxergam até uns de sua própria espécie. Olham para o céu em desespero e o vêem cada vez mais escuro, até as estrelas lhes abandonam. Enquanto isso os leões descansam. Dois, três quartos do dia, dias inteiros, meses, anos inteiros. Em silêncio. Não se deixam dormir, não se deixam sonhar. Se entopem de imagens e sons, buscam carinho, alívio – amor? nem eles mesmos sabem o que é -, saber, escolhendo acreditar em certas mentiras, tentam se esquecer de seu inevitável fim. Os leões se contentam em apenas ser/existir. Não riem, não choram. Não se sujeitam às efemeridades e loucuras dos homens. Os homens são selvagens. Se matam, se comem, se beijam, sem controle, sem razão, sem finalidade. Seus lares são jaulas disfarçadas para animais treinados. Os homens precisam dos leões mais do que são capazes de imaginar. Leões, com suas lápides eloqüentes de um passado ou de um futuro argüido pelos anos. Sim, alguns leões pereceram desde que eles passaram a viver entre os homens, desde uma época de que nenhum leão se lembra mais. Mas de tempos em tempos os leões conseguiam se fazer sentir, e isso os satisfazia. Seus espíritos tocavam os homens, e eles rugiam de seu modo próprio. Mas a crescente surdez seletiva dos homens e sua “superior” racionalidade tornavam isso cada vez mais difícil. Os leões, pacientemente, esperavam.

Em tempo um leão cansou de observar as tolices dos homens. Ao descansar, olhou para o céu, e o não o reconheceu. Não era o seu céu, mal se via a Lua, que parecia distante. E quis dormir, dormir, dormir, dormir, por muito tempo. E se tornou desleixado. Até que, numa tarde de fim de verão, um menino fazia seu trajeto diário, tão repetitivo e – por conseqüência – chato que o pensamento do menino mal se segurava no chão. O menino então viu o leão alvijubado. Tomado pelo medo, o menino ficou imóvel. O leão, fascinado pelo que via, simplesmente observou o menino serenamente. E o menino olhou nos olhos do leão, certo de que morreria. O leão encarou o menino por mais uns segundos, certo de que tinha tocado o menino, e se foi. E então o menino entendeu.

A maioria dos leões voltou para seus lares, enfim. Deixaram os homens entregues aos próprios venenos. Que – talvez – aprendam. 



E se não tiver ficado claro, a ideia pra esse texto veio de exposições repetidas a isso: