terça-feira, maio 17, 2011

You Put A Spell On Me/A Sociologia Diz...



Meu livro de Sociologia diz:
"Os meios utilizados para alcançar o poder podem ser muito diversos, desde o emprego da simples violência até a propaganda e o sufrágio por procedimentos rudes ou delicados: influência social, poder da palavra [...]"



Pareces ter um feitiço sobre mim, poder que é indecifrável, intenso
Tanto que às vezes se deixa esquecer, se camufla,
Quando de fato já está marcado, e deixou o corpo e tudo o mais acostumado
Feitiçaria das mais ardilosas e inebriantes.

Mas como? Por procedimentos delicados, com certeza
Pelo poder da palavra, talvez, palavra inaudível que ecoa longamente aqui dentro
Num simples olhar, na poesia, no jeito,
No tudo que pode ser descrido pelas palavras.

Como se fosses uma espiã nas partes mais íntimas de minha casa,
Sabes meu sonhos, meus medos, meus segredos,
Sabes as palavras que eu anseio em ouvir
E aceito esse ofício de bom grado.

O que pretendes com esse poder me é desconhecido
Se és culpada de thoughtcrimes nisso, desconheço
Mas me deixo levar pelo feitiço, me prendo suavemente, inocentemente, até
Sou teu.

Talvez, como tu disseste,
Sociologia seja, de fato, amor
Deixo esse feitiço escolher
Fico em tuas mágicas mãos.

sábado, maio 14, 2011

Surdez


Estou parcialmente surdo. Não que tenha perdido a audição, apesar dos avisos de alguns desafortunados que não compartilham de minha mania. Mas faz alguns dias que meus ouvidos mal-acostumados têm reclamado. É que meu companheiro fiel partiu. O meu fone de ouvido não funciona mais. Eu tentei de tudo. Eu tentei de tudo. Não funciona. Não funciona... Preciso urgentemente de um fone de ouvido.
Minhas sinceras desculpas aos que virão a achar esse texto digno da mais mimada das crianças, ou do mais fútil dos consumistas. Mas a verdade é que realmente preciso de um fone de ouvido. Se a música é o alimento da alma, um bom fone de ouvido é um cômodo aconchegante em casa, especial para se alimentar até que o enjôo chegue. Também pode ser aquela ajudinha ao caro cérebro, que em certas horas não consegue lembrar aquela canção por preguiça, ou por perturbação dos próprios ouvidos.
Não que eu não saiba apreciar a sinfonia do transporte coletivo da cidade, vulgarmente conhecido como ‘busão’. O retorcer dos metais, o roncar forte do motor velho, o alívio dos freios, o buzinar incessante, sem falar no coral aleatório de duas, quatro, quinze pessoas. Tudo isso tem seu charme, mas é que se perde a graça com o tempo. E assim se adquire uma surdez seletiva. Às vezes até aparece um maestro, que também vem a ser o motorista, mas não é a mesma coisa (não é a minha música, boa ou ruim).
A verdade é que sem ele eu me sinto só. Ainda pior do que só, naqueles momentos entediantes em que se podem ver dezenas de pessoas ao seu redor, mas ninguém para se conversar, naquela estranheza consentida que as cidades grandes parecem possuir com naturalidade. Qualquer que seja a mágica que essa coisa chamada música possui, não há forma mais íntima ou mais acalentadora dela se manifestar do que com o tal do fone de ouvido.
Ao som dos últimos versos de ‘Deus Lhe Pague’ (do Chico) ele se foi, depois de sete meses de lealdade. Agora espero que alguém me pague um novo. Quem quer que seja. Antes disso foi ‘The End’ (The Doors). Como se ele tivesse anunciado seu fim pra mim, falado comigo. Devia ter ouvido.