sábado, setembro 29, 2012

"Voi non capito niente della Russia" (Crítica: Nostalghia)



‘Nostalghia’, de Andrei Tarkovsky, leva às telas um sentimento característico dos russos: o apego fatal à pátria que gera uma incapacidade de se adaptar a outros lugares e estilos de vida. O foco está no poeta russo Andrei Gorchakov (Oleg Yankovsky), que vai para a Itália a fim de fazer uma pesquisa sobre Pavel Sosnovsky, compositor russo que passou um período na Itália no século XVIII. Andrei é guiado pela bela Eugenia (Domiziana Giordano), que serve como tradutora. Atormentado por uma profunda sensação de nostalgia, Andrei tem a todo o momento sonhos e lembranças de sons e imagens vindos de sua terra: sua família, sua casa, canções folk russas, as montanhas cobertas de neblina. Seu destino parece mudar um pouco com ele conhece o enigmático Domenico (Erland Josephson, um dos colaboradores mais freqüentes de Ingmar Bergman, um dos diretores favoritos de Tarkovsky), que trancou sua própria família por sete anos numa tentativa de salvá-los dos males do mundo. A partir daí, fica cada vez mais difícil para Andrei lidar com a relação incerta com Eugenia, as exigências de Domenico e a disputa interna entre o mundo material e o de seus devaneios e memória.
Gorchakov aos poucos percebe que suas sina e identidade se confundem tragicamente com as de Sosnovsky e Domenico, levados à loucura e depressão pelo apego incontrolável aos que amam. Talvez seja um ato forçado, mas é possível adicionar a essa lista o próprio Andrei Tarkovsky, mesmo com ele escrevendo em seu ‘Esculpir O Tempo’ que “seria uma atitude simplista identificar o autor com seu herói lírico”. Simplista ou não, Tarkovsky também vagou pela Itália acompanhado de uma tradutora (e Tonino Guerra, que colaborou no roteiro), e carregou essa nostalgia até o fim da vida.
Ao invés de mostrar paisagens exóticas de uma Itália que parece feita para turistas, ‘Nostalghia’ mergulha no interior de Andrei, dando a seus sonhos uma beleza poética realçada pela excelente cinematografia e uso do preto e branco. Guiados pelo personagem principal, todos os fatores conspiram para dar ao filme uma carga emocional verdadeiramente melancólica e saudosa. O uso de música clássica (principalmente Beethoven) se resume a momentos pontuais, dando um tom especial às cenas. Como todos os filmes de Tarkovsky, este filme está carregado de tomadas longas em ritmo lento, diálogos metafísicos e várias sequências em completo silêncio, exigindo certa paciência. Mas os que aprenderem a contemplá-lo serão recompensados com uma experiência belíssima.